janeiro 02, 2014

iPhone: A inovação criativa não é mero remix

Adoro a série Everything is a Remix de Kirby Ferguson, mas desta vez acabou metendo os pés pelas mãos com o trabalho “Everything is a Remix Case Study: The iPhone” (2013). Ferguson é licenciado em Inglês, e se isso lhe deu background para realizar comparações entre filmes e músicas, assim como analisar em parte a história do copyright, está longe de lhe ter garantido as ferramentas necessárias para proceder a uma análise de um objecto tão complexo, na sua inovação, como o iPhone.


É verdade que tudo no nosso planeta é fruto do remix, porque a ação essencial de criação assenta no remix, mas a inovação criativa não brota apenas da realização de remix (por engenhosa, trabalhosa ou brilhante que seja), ela exige mais, exige um corte com o antes, um rasgar das convenções estéticas e sociais. A inovação criativa exige mais do que um mero incremento a partir daquilo que já antes existia. A inovação criativa é um risco, é um tiro no escuro, e pode funcionar muito bem, sendo capaz de criar caminhos completamente novos para quem vem a seguir, ou simplesmente afundar e arrastar para o buraco quem por aqui se arrisca. Deste modo ser capaz de arriscar no caminho da inovação criativa, não é algo que está ao alcance de todos, nem sequer daqueles que realizam remix, porque requer além de visão, muita obstinação, requer uma atitude de afronta constante ao mundo, uma insatisfação para com o que ele nos apresenta, e isso nem sempre nos traz o melhor do mundo (leiam People don’t actually like creativity, 2013).

Deste modo o iPhone (2007) assim como o Macintosh (1984), representam grandes revoluções de inovação criativa no mundo da computação, marcas deixadas por Steve Jobs. É claro que são fruto de remix, mas são bastante mais do que isso, o remix é apenas a base de partida. Aliás para chegar a esses produtos, para rasgar e vingar, é preciso falhar, ninguém inova sobre inovação, a aprendizagem e evolução acontece com o erro. A Apple e Jobs tiveram vários fracassos, como uma consola de jogos (PipPin), um PDA (Newton), ou ainda a própria companhia NeXT que Jobs criou quando esteve fora da Apple. Ou seja, não existem pessoas criativas por defeito, existem pessoas que de tão obstinadas pelo diferente, e não pelo remix, de vez em quando quebram o status quo, e fazem a sociedade avançar.

Tudo isto para dizer que o filme de Ferguson é uma mão cheia de nada. Dizer que a interface do iPhone é uma cópia de coisas da realidade, e usar uma palavra complexa, skeumorphism, para o definir, em vez de simplesmente falar em metáforas, só me dá vontade de rir. Demonstra que não percebeu nada daquilo que esteve na origem da inovação do iPhone, porque lhe falta conhecimento nas áreas da tecnologia, do design, e ainda mais no design de interação. Aconselho-o vivamente a ler o texto “The Day Google Had to 'Start Over' on Android” (2013) na The Atlantic para ter apenas um pequenino insight sobre aquilo que o iPhone representou em 2007.

Porque não basta ter o dom da palavra e da edição audiovisual. Fazer um trabalho como este que nos é aqui apresentado requer uma enorme bagagem do campo que só pode ser conseguida com vários anos de pesquisa. Não basta ler uns textos na internet e fazer meia dúzia de pesquisas na Wikipedia. Além de que fica muito mal apresentar todas estas ideias como se fossem dos autores do filme. Não são eles a dizer que tudo é um remix, então a partir de onde fizeram o seu remix? Porque o fizeram, basta seguir os links na wikipedia para perceber de onde vieram estas ideias. Depois não deixa de ser estranhíssimo ver no final toda uma lista de referências das imagens, vídeos e sons que foram utilizadas do istock.com e não ver qualquer referência aos textos e vídeos utilizados para compilar as ideias apresentadas. Será que o reconhecimento das fontes na cultura do remix só deve funcionar quando existe financiamento em questão?

Everything is a Remix Case Study: The iPhone (2013) de Kirby Ferguson

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