agosto 15, 2016

Peixoto com Proust e Joyce

O nº31 da Biblioteca de Bolso, de Inês Bernardo e José Mário Silva, traz-nos José Luís Peixoto numa conversa descontraída sobre Bukowski, Eggers e Proust. Se continuo a gostar imenso da maneira de estar de Peixoto, a sua humildade perante o mundo, voltei a identificar-me mais uma vez com o seu sentir, desta vez no que toca a Proust e Joyce. Deixo a entrevista, e alguns comentário a excertos.






Comentários a excertos da entrevista:

JLP: “Não gosto de falar dos livros que li”

Entendo e sigo, embora possa parecer que não, nomeadamente pela conta do Goodreads e pelo blog, mas considero diferente escrever sobre o que se leu de simplesmente colecionar livros lidos para se dizer que se leu. Falo sobre os livros, ou melhor escrevo sobre eles com o propósito de escrever, não me ficar apenas pela leitura, e também com o propósito de aprimorar as minhas capacidades de análise narratológicas — história, estrutura e estética — sendo relevante para o trabalho que realizo profissionalmente.

JLP: “Proust tem momentos de puro êxtase literário”

Totalmente de acordo, é indescritível o que se sente a ler Proust, vertiginoso, capaz de nos elevar ao panteão e aí nos suspender a respiração por breves trechos.

JLP: “Li duas vezes, uma na colecção Europa-América, outra na tradução de Pedro Tamen (..) Tamen se não fosse o poeta que já era, teria ficado para sempre reconhecido por este trabalho.”

Não li a versão EA, e não conto ler já que hoje não é preciso, se tivesse lido quando ele leu não teria tido alternativa, mas não posso deixar de concordar com o que diz a propósito de Tamen, porque li trechos de outras versões, nomeadamente brasileiras e do original, e sinto que Tamen colocou a sua tradução num patamar muito próximo do original, capaz de nos fazer esquecer na maior parte do tempo que estamos sequer perante uma tradução e que Proust na verdade falaria português.

JLP: “Uma coisa que os livros deixam na memória é, certas fases na vida — ‘quando se leu aquele livro’ — porque efetivamente para mim ler o ‘Em Busca do Tempo Perdido’ na edição Europa-América ou depois na tradução de Pedro Tamen, foram duas experiências completamente diferentes, quase podiam ser dois livros diferentes.”

Sem dúvida, a extensão, o tempo de leitura e toda a sua beleza, marca-nos. Ainda só passou um ano, mas sinto que não esquecerei a fase em que o li, e talvez por isso, apesar de o desejar tanto reler, esperarei mais algum tempo para poder separar os sentires das duas leituras.

JLP: “Há livros que nunca li, por exemplo o Ulisses de James Joyce, já comecei a ler várias vezes… hoje sinto que é um livro que nunca vou ler, não sei… vivo bem com isso, às vezes não é preciso lê-los, sinceramente (..)”

Também eu várias vezes tentei, e por uma vez, recentemente, cheguei até meio da obra mas inesperadamente acabei por novamente desistir. Depois disso tenho olhado para ele tantas vezes, mas não mais lá voltei, e ao ouvir Peixoto hoje, dei-me conta que talvez tenha razão, talvez nunca o vá ler, e talvez não seja mesmo preciso. Sim custa-me deixar para trás um livro que é fundamental na história da literatura, mas cada vez mais me convenço que a sua relevância não se deve à experiência que cria ao leitor, mas antes à obra produzida, ao seu virtuosismo modernista. Acredito que mais do que a sua leitura, o que “Ulisses” nos pede é o seu reconhecimento, e aí concordando com Peixoto, não é preciso lê-lo, mas conhecê-lo, compreender a sua génese, forma e objetivo.

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