agosto 07, 2017

La casa de Bernarda Alba (1936)

Federico García Lorca foi assassinado no início da guerra civil espanhola, em 1936, que viria a colocar no poder o ditador Franco. Fuzilado por razões estritamente políticas mas insuficientemente justificáveis — era maçon, socialista e homossexual —  o seu corpo nunca seria encontrado, criando toda uma aura de mistério que decorre até hoje. Lorca tinha apenas 38 anos mas fazia já parte da galeria de artistas espanhóis de reconhecido valor do início do século XX, nomeadamente pela sua poesia, daí que a sua morte poucos dias apenas após terminada a escrita de “La casa de Bernarda Alba” tenha servido para ampliar o seu reconhecimento e o deste texto em particular.


“La casa de Bernarda Alba” não fala de Lorca, nem lhe serviu de manifesto político, ainda que adquira um tom panfletário contra o conservadorismo da Espanha rural e profunda, pondo a nu a posição da mulher na sociedade, nomeadamente o cinto de regras que a condicionava e domesticava, e que colocava as aparências acima do sentimento. A história contada é bastante simples e curta, e em parte adaptada de um caso real conhecido de Lorca: uma mãe viúva controla cinco filhas em idades casadouras, impondo o celibato e a hierarquia familiar com mão de ferro. É uma história que traz pouco de novo à paisagem narrativa do século XXI, onde histórias destas pululam por todo o lado. No entanto, se lida dentro do contexto histórico próprio ganha todo um conjunto de outras dimensões que dão força ao texto, ainda assim se o texto merece continuar a ser lido, é menos pela sua história e mais pelo seu estilo.

A primeira impressão do texto surge ao fim de poucas páginas e é bastante forte, com as personagens a edificarem-se do papel e a criarem a sensação de que quase lhes conseguimos tocar. Isto acontece pela força dos diálogos e do ritmo, que são absolutamente perfeitos. À medida que vamos lendo, vamos compreendendo e sentindo as diferentes personagens pelo simples modo como falam, por outro lado o ritmo imprimido pela troca de falas, muito curtas, entre as personagens é de tal ordem que nos transporta para o interior da cena, fazendo esquecer que de uma cena se trata. Lorca parece não dar conta do espaço nem do visual, contudo basta-lhe o que cada personagem diz para nos fazer ver os lugares, os costumes, os gestos e os trejeitos. É drama puro, é a capacidade de encenar realidade e dá-la a sentir encarnando-a nos agentes de cena.
"Mujer 1: Los pobres sienten también sus penas.
Bernarda: Pero las olvidan delante de un plato de garbanzos.
Muchacha 1: (Con timidez) Comer es necesario para vivir.
Bernarda: A tu edad no se habla delante de las personas mayores.
Mujer 1: Niña, cállate.
Bernarda: No he dejado que nadie me dé lecciones. Sentarse. (Se sientan. Pausa)
(Fuerte) Magdalena, no llores. Si quieres llorar te metes debajo de la cama. ¿Me has
oído?"
Todo o texto é uma tensão contínua e progressiva, seguindo as melhores lógicas da tragédia grega na busca por uma catarse plena, com a particularidade estilística de se conseguir pela vivacidade, fluidez e naturalismo dos diálogos. A crítica fala de uma "poetización del lenguaje cotidiano”, e isso pode ver-se no modo como sentimos emergir do texto o intelectual e o popular num conflito constante. É impossível ficar indiferente à sua leitura que recomendo em espanhol para poder sentir o drama mais de perto, ainda que claramente eu precise de o experimentar um dia num palco.

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