novembro 12, 2012

Entrevista sobre festival "Caminhos do Cinema Português"

Na semana passada o jornal universitário de Coimbra, A Cabra, enviou-me um entrevista por e-mail sobre o festival Caminhos do Cinema Português que decorre em Coimbra há várias décadas e que entra agora na sua XIX edição. O interesse prendia-se com o facto de eu ter participado na re-fundação do festival em 1997. Entretanto o artigo foi publicado no sítio do jornal, mas muito do que disse ficou naturalmente de fora da peça, e por isso aqui publico as minhas respostas integrais. Os filmes apresentados em imagens ao longo do texto estiveram todos presentes no festival desse ano de 1997.

Cartaz e capa do catálogo da reedição de 1997

1 - Como foi o processo de reativação do festival, depois do interregno de sete anos?
:: Foi complicado e muito duro porque tinham passado já alguns anos depois da última edição, e já não existiam ligações às instituições nem pessoas, tendo sido preciso fazer tudo do zero como se a mostra nunca tivesse existido. Estou a falar do ICA (na altura tinha a designação de IPACA) e do TAGV, mas também dos apoios de financiamento necessários e vitais para garantir um festival desta natureza, assim como dos realizadores, dos atores, dos produtores, diretores de fotografia, entre muitos outros.
Foi um ano completo a trabalhar, com vários dos elementos da comissão executiva a trabalhar full-time no evento, deixando os cursos de lado, deixando tudo de lado para que o evento se tornasse real. Foi uma luta até ao último dia, mas conseguiu-se recriar um evento que é fundamental em Portugal e que muito me agrada que se tenha mantido até hoje, e esperemos que continue por muito mais tempo.

TAGV (foto de Pedro Medeiros)

2 - Quantas pessoas estiveram envolvidas nesse processo?
:: Estiveram envolvidas diretamente e ao longo de toda a produção oito pessoas: Nelson Zagalo, Manuel Nunes, Jaime Rodrigues, Bruno Dias, Carlos Pinto, Sara Seabra, Osvaldo Mota e Adelino Rocha. Tudo elementos que pertenciam nessa altura à direção do CEC. É claro que estiveram envolvidas muitas mais pessoas, desde os sócios a elementos de outras secções culturais, da DG/AAC, do TAGV, da UC o que no total deverá ter ultrapassado as 40.

Má Sina (1996) de Saguenail

3 - Quais foram as novidades que essa edição trouxe relativamente às mostras realizadas antigamente?
:: A primeira e mais evidente, foi a transformação de um evento que era uma Mostra, num Festival o que implicou várias dimensões além do mero ciclo de filmes, como mesas redondas, workshops, prémios, convidados, filmes de abertura e encerramento, etc. Uma das grandes atrações desta reedição foi tentar trazer filmes que tinham sido financiados com dinheiros públicos mas ainda não tinham sido estreados em Portugal, algo que era comum nos anos 1990. No campo das curtas tivemos linhas dedicadas: à Escola Superior de Teatro e Cinema; à Animação nacional; à Video Arte; e ainda uma extensão da Mostra de Vídeo Português Contemporâneo da Videoteca de Lisboa. Além disso criámos o primeiro prémio dedicado a uma figura de relevo cinematográfico nacional e não mediática, o Ardenter Imagine. Foi também neste ano que conseguimos que o evento fosse reconhecido pelo Ministério da Cultura como sendo de “Manifesto Interesse Cultural”.

Kilas, O Mau da Fita (1980) de José Fonseca e Costa

4 - Nesse ano, quais foram os principais destaques cinematográficos?
:: Abrimos o Festival com a estreia de Mortinho por Chegar a Casa (1996) de Carlos Silva e George Sluizer, contando com a presença do Carlos Silva. E depois fizemos o encerramento com Kilas, o Mau da Fita (1980) que se tornou num dos grandes momentos desse festival.

Mortinho por Chegar a Casa (1996) de Carlos Silva e George Sluizer

5 - Qual foi o feedback que tiveram? Houve incentivos para que ficassem motivados a continuar?
:: Sim, sem dúvida, sentimos no final, nomeadamente da parte da comunidade nacional cinematográfica um carinho especial por aquilo que se tinha conseguido fazer ali, e muita vontade de continuar a colaborar para que o evento se tornasse num evento central do cinema nacional.

Três Irmãos (1994) de Teresa Villaverde

6 - Ficou na organização do festival durante quanto tempo?
:: Fiquei apenas nesse ano, era já o meu segundo ano na direcção do CEC. Como expliquei acima foi esgotante, mas não só, não se pode pedir que festivais com esta magnitude sejam feitos em mero regime de voluntariado. Era preciso retomar os estudos.

O Fim do Mundo (1993) de João Mário Grilo

7 - Que histórias guarda deste festival? Algum episódio caricato que tenha acontecido em alguma edição que queira partilhar...
:: Muitas histórias, muitos momentos que ficaram nas nossas memórias, de angústias e alegrias passadas em conjunto com as pessoas que formaram aquele fantástico grupo que levou este projeto de uma simples ideia e desejo ao evento em que ele se tornou.
Ao revisitar o catálogo dessa edição, relembrei o episódio de renderização e impressão do cartaz que serviria para espalhar pelos "mupis" de várias cidades nacionais (a imagem que está no topo deste texto). Foi uma aventura que passei com o autor do cartaz, o David Miguel Coimbra, um dia e uma noite completa à volta do 3d Studio em casa deste no Porto, para conseguir renderizar com os textos correctos, e conseguir chegar a horas a gráfica do Porto a tempo de poder ser imprimido e enviado às Câmaras. Passámos a noite a olhar para a barra de render em total desespero, só conseguindo terminar no dia seguinte quando era já quase meio-dia. O mesmo se passou com o catálogo, mas aqui quase sozinho, em que passei mais de 24h seguidas colado numa cadeira a terminar detalhes para depois fazer seguir para a gráfica, parece que ainda me lembro da cadeira em que estava sentado.

Oxalá (1980) de António Pedro Vasconcelos [excerto]

8 - Alguma exibição que o tenha marcado, seja enquanto espetador ou membro da organização?
:: Sim quando voltei ao festival como Júri passados alguns anos, em 2001, adorei ver a curta-metragem de Sandro Aguilar, Sem Movimento (2000), nunca mais a esqueci, apesar de nunca mais a ter conseguido rever. O seu trabalho de movimento visual nesta curta é magistral. Pena que como acontece como muito outro cinema português, as obras fiquem inacessíveis. Daí que festivais como os Caminhos adquiram uma ainda maior importância.

Passagem por Lisboa (1993) de Eduardo Geada

9 - Hoje ainda colabora com o CEC?
:: Apenas pontualmente. Por acaso encontro-me neste momento a colaborar com a segunda edição de Cinemalogia.

Cartaz da XIX Edição, 9 a 17 de Novembro 2012

10 - O que pensa do facto de existir apenas um festival exclusivo de cinema rodado em português?
:: Penso que é fundamental, que deve ser preservado, apoiado e acarinhado por todos. É um dos poucos momentos em que o amor à cultura cinematográfica nacional se abre sem rodeios e sem complexos.

ritmo e surrealismo

Heart (2010) de Erick Ho é um trabalho de uma enorme grandiosidade experimental a roçar o surrealismo daliniano. São 8 minutos de acção visual com uma narrativa desestruturada, mas capaz de nos fazer sentir o crescendo. Heart é o resultado da tese de mestrado em Digital Media de Erick Ho na UCLA School of Theater Film and Television, depois disso foi trabalhar para a Pixar.


Erick Ho procura neste pequeno filme testar os limites da narrativa no âmbito da animação, e para isso socorre-se de um forte leimotiv, o coração, que todos conhecemos e ao qual atribuímos imensos potenciais significados. O filme decorre com base numa luta constante pela posse do dito coração, sem que nós possamos compreender exactamente porquê, embora tratemos de inferir imensos sentidos e possibilidades explicativas. Mas o que é relevante aqui é entrar, imergir na atmosfera do filme de Erick Ho, que por vezes parece um autêntico trabalho orquestral, no sentido em que o som serve de condutor ao movimento gráfico. O ritmo é assim perfeito porque fruto de um trabalho de mestria na combinação entre montagem, som, música e animação.




Não é um filme sobre o qual possamos escrever muito, porque é um trabalho experimental, que como tal precisa de ser experienciado para ser compreendido. Fala-nos numa linguagem particular, não assimilável por comuns cânones da análise filmográfica. O filme foi apresentado numa imensidão de festivais, tendo ganho vários prémios, e está agora disponível na internet.

An exploration of transcendence. HEART presents questions through abstract metaphors and symbols, illustrated by the human heart.

novembro 10, 2012

à deriva

Adrift (2012) é mais um experimento interactivo do que um jogo, criado por Tom Campbel para o Mini Ludum Dare #37, apesar disso responde plenamente aos objectivos traçados para o MiniLD, ser um not-game e ao mesmo tempo basear a interacção no uso do tempo real.


Tom Campbell é um jovem de apenas 22 anos, da Nova Zelândia, formado em Media Design na especialidade de desenvolvimento de jogos, apresentando-se como um apaixonado pela arte 3d. Na verdade é a sua paixão pelo 3d que mais sobressai neste trabalho, a beleza gráfica inebria-nos, deixa-nos "adrift". Neste não-jogo entramos num mundo que é constituído por apenas um barco à deriva em alto-mar e do qual não podemos sair, podemos apenas deambular entre a traseira e o interior do mesmo.


O jogo foi desenvolvido em Unity tendo o mar sido criado com recurso ao plugin Ocean Unity, e o céu com o plugin UniStorm. Deste modo tudo foi criado em 48 horas.


O interesse do jogo acaba por se revestir na forma como nos obriga a contemplar o mundo apresentado, sendo que dependendo da hora em que entramos no jogo, a atmosfera é distinta, podendo o jogador experienciar desde o nascer do sol ao pôr do mesmo, experienciando chuva e relâmpagos pelo meio, apreciando as estrelas. É uma experiência minimal, como tal cada um sentirá o jogo de diferentes formas .


Recomendo. Podem jogar directamente online ou descarregar para PC/Mac no sítio do autor.

paciência e perseverança

Origami (2012) é mais um belíssimo trabalho da ESMA (École Supérieure des Métiers Artistiques) realizado pelos alunos Joanne Smithies, Eric De Melo Bueno, Michael Moreno, Hugo Bailly Desmarchelier e Camille Turon.


Origami é brilhante porque apesar de se focar sobre a arte do origami aborda duas qualidades essenciais à própria arte da Animação - a paciência e a perseverança. São duas características que qualquer animador sabe serem essenciais, mas invisíveis para quem vê de fora. Todos os anos em que dou a cadeira de Animação falo nelas no início do semestre, mas os alunos só as percebem quando chega a altura de desenvolver os seus projectos e começam a sentir a dureza do esforço necessário à concepção do que imaginaram nas suas cabeças.


Este pequeno filme metaforiza muito bem o processo de luta interna que ocorre quando temos de ser perseverantes para continuar a trabalhar, a experimentar, a criar até conseguir desenvolver aquilo que imaginámos e desejámos criar. A metáfora mostra como o medo de não conseguir se apodera de nós, como experimentando com elementos mais simples vamos conseguindo escapar dessa perseguição, com a paciência e a preseverância vamos evoluindo na arte e vamos assim escapando da escuridão que é a incapacidade de fazer. O brilho que vemos ao longo dessa perseguição não é mais do que a compensação interior por termos alcançado os objectivos, como se esses servissem para iluminar o nosso caminho na concepção de projectos cada vez mais arrojados.


Sem dúvida, uma obra de grande valor, e que no campo formal não fica em nada atrás. Adoro as texturas, não gostei inicialmente do design dos personagens, mas ao longo do filme acabamos por nos apaixonar por eles. Por sua vez o controlo da iluminação e composição musical contribuem cabalmente para construir a atmosfera perceptiva necessária à interiorização dos dois conceitos.

Origami (2012)

novembro 09, 2012

narrativa, um modelo universal

O experimento aqui apresentado pelo neurocientista Paul Zak não é nada de novo para quem estuda narrativa a partir de uma abordagem cognitivista. Mas sinto-me obrigado a partilhar isto mesmo porque apesar de sabermos que assim é e eu fazer um esforço contínuo para pregar isto, noto uma resistência enorme por parte das pessoas ao conceito. Nomeadamente o pessoal mais ligado à arte e humanidades, que procura questionar sempre os modelos estruturados, principalmente quando estes são partilhados de forma muito universal.


O problema, ou melhor, a essência do storytelling, está no modo como se liga à biologia humana, o modo como actua sobre as nossas emoções, e é exactamente sobre as emoções que tenho vindo a desenvolver o meu trabalho, seguindo trabalhos de especialistas como Jerome Bruner, Dolf Zillmann, Ed Tan, Torben Grodal, António Damásio, Paul Ekman, Jaak Panskeep, Joseph LeDoux, Brian Boyd, Frans de Waal, Giacomo Rizzolatti entre outros.


Assim o storytelling nao é uma estrutura que criámos agora há uns 100 anos com o cinema, nem com a literatura, nem tão pouco com o teatro, é bem mais antigo que isso. É quase tão antigo como o aparecimento da linguagem, e nesse sentido sofreu muitas transformações ao longo de milénios de evolução da humanidade, atingindo o estado atual como o conhecemos. Em todos estes anos, o nosso cérebro co-evoluiu juntamente com a linguagem e com os processos de storytelling, transformando este processo na tecnologia mais elaborada na transmissão e apreensão de informação alguma vez criada pelo ser humano. É uma estrutura bem simples, mas é uma estrutura que activa de forma plena a base química do nosso cérebro, ativando as componentes base necessárias à compreensão e à retenção de informação.


Particularmente nas últimas décadas temos procurado pôr à prova este modelo, primeiro pela inovação estética com modelos minimalistas e anti-estrutura nas várias formas de expressão artística (Literatura, Cinema, etc). Segundo criando novas tecnologias capazes de ir além dos tradicionais meios de expressão como o hipertexto e os videojogos. Mas a realidade é que o modelo tradicional de storytelling que ainda hoje todo o ser humano comunga, e que foi tão bem analisado por Aristóteles na Poética, continua a ser o melhor modo de compreender o mundo que nos rodeia, porque é o modelo que melhor nos permite compreender o Outro, sentir com o Outro, e sentir pelo Outro, e assim enriquecer o poder da teia social, através de um mero processo de comunicação. Como diz Paul Zak, "That's what means to be a social creature. Stories connect us with the others."


Este filme Empathy, Neurochemistry, and the Dramatic Arc de Paul Zak faz parte de uma colecção de vários filmes e trabalhos desenvolvidos para um seminário sobre o Futuro do Storytelling que vale a pena visitar e ver.

Empathy, Neurochemistry, and the Dramatic Arc (2012) de Paul Zak


materializar uma ideia

O Your Film Festival em que participou o filme português North Atlantic de Bernardo Nascimento, chegou ao final em Veneza no início de Setembro deste ano e o filme aí premiado foi La Culpa de David Victori (Espanha). Sei que já passou algum tempo, mas só agora o consegui ver. Foi importante para o filme português estar nos 10 seleccionados, mas é ainda mais importante perceber o que leva um filme a ser escolhido de entre 15 mil, o que o torna memorável para as pessoas, o que as marca, e porque o consideram acima dos outros, porque o escolhem.


Julgo que o filme La Culpa responde muito bem a estas questões. Num curto tempo de 12 minutos Victori dá-nos a experienciar a essência da arte cinematográfica. La Culpa é capaz de materializar, de plastificar, em imagem e som de forma perfeita, um conceito. Aquilo que temos aqui é o conceito de culpa definido em moldes audiovisuais, de modo simples, claro e muito directo. Somos convidados não a ver ou a ouvir a definição do conceito, mas a experienciá-lo através de uma fortíssima metáfora audiovisual. Uma verdadeira pequena pérola cinematográfica

Se ainda não viram, aproveitem.

Brasil e Games em 2012

Mais uma viagem ao Brasil no âmbito do meu trabalho de investigação em videojogos. Desta vez passei por três grandes cidades, e quatro universidades, para presidir a uma conferência, visitar grupos de trabalho, e fazer palestras.


Fui inicialmente para Brasília onde decorreu o XI Simpósio Brasileiro de Games e Entretenimento Digital - SBGames 2012 presidido pela Carla Castanho com o apoio da SBGames presidida pelo Esteban Clua, e no qual participei como co-chair da Trilha de Cultura (ver Proceedings) com o Roger Tavares (professor da Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN). Este foi o primeiro ano em que tivemos portugueses a participar como chairs na conferência, tendo estado para além de mim, o Licínio Roque de Coimbra na trilha de Computação. A participação deste ano em Cultura foi menor porque exigimos pela primeira vez que a submissão de Full Papers fosse realizada exclusivamente em inglês. Ainda assim, menor não quis dizer pior, antes pelo contrário, os artigos que nos chegaram neste formato e obedecendo às normas, eram praticamente todos de boa qualidade. Interessante, porque nos anos anteriores em que tínhamos a possibilidade de submissão em Português, recebia-se o dobro e até o triplo de papers, mas esse dobro não se refletia concretamente em melhor qualidade, antes nos fazia perder muito mais tempo no processo de revisão.

Brasília, cidade do SBGames 2012

Dos 17 full escolhemos 14, dos 41 shorts escolhemos 20. Deste modo este ano organizámos três mesas de full – Corpo e Psicologia; Educação; e Metodologia –  e short papers foram apresentadas apenas na FastTrack e como Poster. A primeira mesa foi gerida por mim, a segunda pelo João Mattar, e a terceira pelo Roger Tavares. Tivemos apenas um paper que falhou a apresentação, os restantes apareceram e contribuíram para debate em redor da investigaçãoo em videojogos no campo da cultura, que é um campo bastante vasto. Aliás discutimos entre nós a designação da Trilha, porque ela acaba por colidir com outras trilhas da conferência. Este ano já se resolveu a questão da trilha Game for Changes, de qualquer modo continuará a existir cruzamento entre Arte e Cultura. Mas isso cabe às comissões permanentes da SBGames avaliar, do meu lado e no meu papel de chair este ano acredito que o assunto precisa de ser discutido, porque mesmo para o mero participante torna-se complicado fazer esta divisão, e ter de optar em participar numa trilha ou noutra.

Preparando a ligação com Chris Crawford

De qualquer modo a trilha foi bem concorrida, e geraram-se interessantes discussões no âmbito da mesma, nomeadamente no campo da psicanálise, storytelling, emoção e gamificação na educação. A cereja ficou para o final, o keynote speaker da Trilha de Cultura, que eu e o Roger convidámos para falar, foi nada menos que o lendário Chris Crawford. Mas esta foi uma talk especial, porque não queríamos que ele falasse de game design ou interactive storytelling, pedimos-lhe antes para comparar o desenvolvimento de jogos nos 1970-80 com o desenvolvimento actual, e daí surgiu a talk, The Good Old Days Weren't So Good que foi um sucesso. As pessoas adoraram o detalhe com que Crawford apresentou os tempos iniciais da programação de jogos, e as comparações que fez com os dias de hoje, com bastante contextualização. Apesar de ter sido por teleconferência, por este não se querer deslocar de avião para fora dos EUA, a keynote correu muito bem.

No final da palestra na UFRN o Roger Tavares ofereceu-me o livro Mapa do Jogo

No final da SBGames fui para Natal para visitar o Núcleo de Games que o Roger Tavares está a tentar desenvolver na UFRN, e foi interessante verificar a forte motivação dos alunos, tanto do lado da Comunicação e Arte como do lado da Computação. Apesar do Roger estar mais envolvido com a Comunicação e Educação na palestra estiveram presentes os alunos do núcleo de games de computação orientados por Rummenigge Dantas. Assim na UFRN participei no evento Segunda Gamer na qual falei um pouco sobre aquilo que é o desenvolvimento de videojogos em Portugal, mas dediquei o tempo mais a discutir processos de game design, nomeadamente princípios de avaliação cognitiva que permitem ao designer optimizar o seu trabalho – Porque Jogamos? Ávidos por Padrões. (Slides da Palestra).

Ilha do Porto Digital em Recife

Daí segui para Recife para me encontrar com o amigo André Neves (Professor de Design da U. Federal de Pernambuco - UFPE), que conhecia há anos online mas que ainda não tinha tido o prazer de conhecer pessoalmente. Visitei o Porto Digital que é uma ilha tecnológica da cidade de Recife onde se sente a efervescência da economia brasileira e onde visitei a Jinx Playware a empresa de videojogos mais antiga no activo (12 anos) e a Joy Street que é liderada pelo próprio André Neves, conjuntamente com o Fred Vasconcelos (presidente da  Associação Brasileira de Jogos Digitais - Abragames) e o Luciano Meira (Professor de Psicologia Cognitiva também na UFPE). O André e o Fred fizeram uma apresentação do seu projecto de educação gamificada OJE - Olimpíadas de Jogos Digitais e Educação  que foi já testado com cerca de 100 mil estudantes e professores dos estados de Pernambuco, Rio de Janeiro e Acre. Este é bem capaz de ser um dos maiores projectos feitos até hoje com técnicas de game design e gameficação para educação. Pelo que me foi apresentado posso dizer que não se trata de mera pontificação ou PBL (Points, Badges e Leaderbords). Aliás, fiquei muito contente por ver que neste projeto o game design é totalmente envolvido por Narrativa, que é aquilo que tenho defendido desde que começámos a detectar os problemas da pontificação. Fiquei impressionado, e promete!

Jardim interior do Centro de Artes e Comunicação da UFPE

Depois fomos para a UFPE e aí gostei muito do que vi no Centro de Artes e Comunicação da Universidade, pelo espaço que possuem, mas também pela criatividade que emana do local com as paredes cobertas de trabalhos, os alunos a realizarem performances no meio dos corredores, os ateliers com sinais de muito uso e intensivo, o uso de maquinaria antiga para potenciar a mescla analógico e digital. Conheci aí o grupo de investigação do André o GDRLab, e foi para esse grupo de alunos oriundos do curso de Design que dei a palestra. Aqui falei sobre algo que o André me pediu, a Investigação em Videojogos em Portugal (Slides da Palestra). Confesso que não me senti totalmente à vontade para o fazer pois acreditava eu que aquele público não estaria muito interessado na investigação que se faz deste lado do oceano e poderia estar mais interessado em obter conhecimento para os seus projetos. Dessa forma procurei falar sobre alguns projetos em particular, e contextualizar os mesmos. No final os alunos responderam muito positivamente o que foi excelente.

Maqueta física do jogo Portal de Astaroth criado por Fabiano Felipe, Guilherme Gomes e Pedro Travassos da UCP em Recife

Finalmente e ainda em Recife, o Rodrigo Medeiros, meu ex-mestrando em Tecnologia e Arte Digital na UM, levou-me à Universidade Católica de Pernambuco (UCP) para conhecer as instalações do curso de Jogos Digitais. Nesse sentido tive oportunidade de conhecer alguns alunos, de visitar os laboratórios, e conhecer vários professores. Como poderão ver no artigo feito pela Universidade no site do curso de jogos a propósito da minha visita, gostei bastante de ver as maquetas físicas para conceptualização de arte e game design, e vale a pena darem uma vista de olhos nos trabalhos feitos pelos alunos com as maquetas. Foi uma visita rápida, mas muito interessante.

novembro 08, 2012

Hino à criatividade

O portal Behance, conhecido por servir de plataforma de portefólio a muitos artistas e criadores online, resolveu criar um pequeno vídeo de promoção sobre os aspectos criativos e chamar-lhe, Hino ao Trabalho Criativo (2012).



Para quem trabalha na área vai sentir-se representado por este hino, sentir que existem muitos mais por aí, que sentem da mesma forma, e que acima de tudo vale a pena, porque como é dito: "It's not about money or fame, it's about doing what we love."

An Ode to Creative Work (2012) do Behance

Behind every great advancement, in every industry, there is a creative mind.
Creativity may come easy, but creation is hard.
The late nights spent trying, and failing, and trying again.
All the while, holding onto our vision.
Pushing what we see in our mind's eye into the world.
But our brilliance is being held captive by forces around us and within us.
Middle men who play us down while marking us up.
Not giving us credit. Getting us to work for free.
And worse, we get in the way of our own success.
We rely on chance encounters. We’re disorganized and isolated, liable to go unnoticed.
We can do better.
When creative minds come together, the sum exceeds all expectations.
We connect, we learn, we critique, and we prosper.
It's not about money or fame, it's about doing what we love.
It's about creating our greatest work on our own terms.
It’s about realizing that creativity is not just an opportunity - it's a responsibility.
Here's to unleashing our full potential.
For us, and for the world that awaits what we will do next;
Take creative control.

novembro 04, 2012

do comic para a animação interactiva

The Art of Pho (2012) nasceu como uma história de banda desenhada criada por Julian Hanshaw e chega-nos agora na forma de motion comic. Antes da banda desenhada Julian Hanshaw trabalhou como animador em algumas das séries infantis mais premiadas de sempre, nomeadamente Charlie & Lola e Yoko! Jakamoko! Toto!. Mas agora o trabalho de animar o comic de Julian Hanshaw ficou a cargo da fantástica Lois van Baarle de quem tenho vindo a seguir o trabalho aqui.


Em termos de motion comic trata-se de um formato em ascenção à custa da web, e que procura de algum modo criar uma nova linguagem na área dos comics. A variabilidade do formato é grande, temos tido desde simples movimentos atribuídos a objectos e personagens mantendo os quadros dos livros, até trabalhos com grande detalhe de animação e som. No caso de Art of Pho para além da excelência de animação que se desenvolve a partir de um cruzamento perfeito com a gramática do comic, temos ainda a qualidade da banda sonora que contribui imenso para a atmosfera, mais mais interessante que isso, foram ainda desenhados acessos interactivos à obra que desenvolvem um sentido participativo no espectador/leitor.


A componente interactiva joga aqui um papel fundamental no modo como a linguagem da animação e dos comics se cruzam, facilitando esse processo, colando a estática de uma com a dinâmica da outra, e em cima de tudo isso contribuindo para engajar mais fortemente o espectador/leitor/jogador. Podemos chamar de animação interactiva, dificilmente se pode qualificar de jogo, mas é simplesmente arte da interactividade. Mesmo a forma como o layout é desenhado é feito no sentido de criar espaço para a participação do interactor. Não temos uma tela cheia, temos muito espaço negativo que vai sendo preenchido de forma animada, e em que por vezes somos chamados a contribuir.

Making of "The Art of Pho"

O tema da banda desenhada surgiu de uma viagem de Julian Hanshaw ao Vietnam em 2006 aonde ele se sentiu envolvido por toda uma outra cultura que mexeu consigo, e o levou a criar o livro The Art of Pho. Pho é o nome dado a uma espécie de sopa vietnamita, e é à volta dela que a narrativa se desenrola, construindo toda uma lógica de análise das relações humanas e da descoberta das raízes de cada um.

Prancha do livro, The Art of Pho (2010)

Em termos visuais é uma obra de autor com uma clara marca na atmosfera, cor e traço. Sentimos que entramos ali, e nos deixamos perder no mundo de Pho. Por outro lado e como diz o próprio Julian, a Lois conseguiu muito bem capturar o essencial da série, e dar-lhe vida, não apenas dinâmica, mas criar pequenas participações com o espectador que o ligam mais ao coração da narrativa. O livro era já muito visual, mas aqui essa dimensão ganha ainda mais relevo, juntamente com a música e a interação.


Vejam os 8 episódios no site do Submarine Channel, e depois vejam o Making Of. E se quiserem mandem vir o livro da Amazon.

novembro 02, 2012

Filmes de Outubro 2012

Mais um mês com muito pouco cinema, e começo a ressentir-me da falta deste. Sinto muito claramente que o cinema contribui para o meu equilibrio e sanidade mental, ajuda-me a relativizar a realidade, e a encara-la de modo menos permanente. Nesse sentido Detachment é um filme excelente porque nos leva através de uma viagem alucinante na vida de um professor temporário que substitui professores temporariamente em escolas complicadas, ajudando a relativizar as nossas vidas. Já Chico e Rita ajuda-nos a sonhar, o detalhe e cor dos cenários são um deleite que nos ajudam a imaginar, a viver por breves momentos vidas de sonho. Por outro lado Medianeras lembra-nos o que somos e do que somos feitos, fala-nos das novas realidades de comunicação online que supostamente devia substituir a necessidade de contacto fisico, mas acaba por não ser suficiente. Finalmente 360 o último filme de Meirelles é um belíssimo trabalho visual que acaba por sucumbir a fragilidade narrativas, muito por falta de substância na mensagem.

xxxx Detachment 2011 Tony Kaye EUA

xxxx Chico e Rita 2010 Tono Errando Espanha

xxx Medianeras 2011 Gustavo Taretto Argentina

xxx 360 2011 Fernando Meirelles UK/Brasil

xx Battleship 2012 Peter Berg EUA
xx Men in Black 3 2012 Barry Sonnenfeld EUA

xx Turistas 2009 Alicia Scherson Chile
xx When a Stranger Calls  2006 Simon West EUA

x Thunderstruck 2012 John Whitesell EUA
x Rock of Ages 2012 Adam Shankman EUA

[Nota, Título, Ano, Realizador, País]
[x - insuficiente; xx - a desfrutar; xxx - bom; xxxx - muito bom; xxxxx - obra prima]